segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Escuridão.


Que valor haveria se não tivéssemos nos permitido visitar a escuridão?

A tristeza é o telescópio da verdade, e ela mora nas frestas de uma quarta feira chuvosa qualquer, no exato instante em que você volta para casa e senta perto da janela com um livro nas mãos, sabendo que, cedo ou tarde, a Tristeza, essa dama, voltará e bater na porta para convidar você a dançar.

Ao aceitar, você estará automaticamente aceitando se transformar, porque a verdade é que não há outro modo de se tornar uma pessoa melhor, mais humilde, mais atenta, menos vaidosa e menos orgulhosa senão dar as mãos à tristeza e sair rodopiando com ela pela sala.

A alternativa – negá-la – fará de você uma pessoa menos sensível, menos atenta, mais ligada à enxurrada de futilidade que flerta com cada um de nós todos os dias.

Vivemos num oceano de imensas dores, basta olhar em volta.

E, mesmo que a alegria suprema fosse amplamente alcançável, seria possível ser completamente feliz enquanto existisse um ser vivo sofrendo na Terra?
O nascimento de um homem é o nascimento de sua dor.

E, se há mesmo um criador de tudo isso, ele talvez esteja esperando que matemos a última grande charada: a de que, ao espantarmos os demônios, estamos mandando embora com eles também os anjos. A de que, ao escaparmos da dor a todo custo, estamos aceitando deixar de reconhecer a felicidade em suas infinitas tonalidades e possibilidades.

Aí fica fácil perceber que Deus e o diabo não são inimigos, mas complementos. E que o contrário do amor não é o ódio, mas o medo – especialmente aquele medo que nos é apresentado em trajes de gala: o medo de sentir.

Lembrei de um dia em que vi minha mãe chorar, do dia em que intuí que seria mais adequado não falar a respeito da inescapável tristeza que é viver um dia após o outro.

E eu, que recentemente fiz as pazes com toda a escuridão que me cerca, gostaria de ter, naquele dia, podido dizer a minha mãe que esse era mesmo o ritmo das coisas nesse planeta maluco em que nascemos, e que, no final, tudo ia ficar bem.

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